Hans Urs von Balthasar – Diálogos de beleza e esperança.

Hans Urs von Balthasar (1905-1988)

Hans Urs von Balthasar (1905-1988) foi um teólogo suíço que não foi chamado para o Concílio Vaticano II. No entanto, anos antes do Concílio ele já adiantara a necessidade de “derrubar as muralhas” que separavam a Igreja do mundo, e seus textos influenciaram deveras os conciliares, assim como foi uma grande influência para o papa São João Paulo II. Este o chamou para ser cardeal por três vezes até ele finalmente aceitar, porém Balthasar veio a falecer dois dias antes da cerimônia na qual receberia o solidéu cardinalício. O então cardeal Ratzinger – futuro papa Bento XVI – fez a homilia nas exéquias de Balthasar. Ratzinger e Balthasar, juntamente ao cardeal Henri de Lubac e outros, haviam fundado a revista Communio, na qual expressavam a necessidade de impor limites na maneira de interpretar e agir a partir das novidades do Vaticano II: “derrubar as muralhas” deveria manter a identidade cristã, evitando abraçar os problemas da modernidade.

Hans Urs von Balthasar

A obra de Balthasar é vasta, com destaques para a mariologia e o laicato (em um tempo em que valorizar o laicato não era comum). Editou as visões da mística Adrienne von Speyr, que lhe foi uma grande inspiração e colaboradora na Comunidade de São João para leigos consagrados. Os escritos de Balthasar sobre os Pais da Igreja – Gregório de Nissa, Orígenes, Irineu, Máximo Confessor, sob influência de seu professor Henri de Lubac – lhe renderam como prêmio a Cruz de Ouro do Monte Athos por parte da Igreja Ortodoxa Grega. Mas este não foi seu único papel no ecumenismo, uma vez que também foi grande amigo e colaborador mútuo do teólogo protestante Karl Barth, com quem partilhava a paixão por piano e Mozart.

E foi primeiro na música que Balthasar desenvolveu seus conhecimentos, seguindo para os estudos em Germanística, na qual pesquisou sobre a escatologia na literatura alemã. Apesar de ter nascido católico e ser devoto de Nossa Senhora, não tinha interesse em teologia até os tempos de universidade, quando foi influenciado pelo padre e teólogo Romano Guardini. Aos 22 anos, Balthasar participou de um retiro inaciano para descobrir sua vocação, e a partir dos exercícios espirituais de Inácio de Loyola, sente-se chamado para seguir a Jesus Cristo, ingressa na Companhia de Jesus, e é ordenado sacerdote sete anos depois, em 1936.

Mas ao ser dada a ele a escolha entre uma cátedra na Universidade Gregoriana de Roma e uma função como capelão estudantil na Basileia Suíça, ele escolheu a capelania para exercer seu trabalho pastoral, e passava aos jovens estudantes os exercícios inacianos que tanto lhe haviam sido significativos. E essa não foi a única ocasião em que ele negou o trabalho em universidades e outros cargos maiores, ou mesmo prejudicou a própria aceitação dentre os jesuítas em prol de abraçar o projeto de um instituto católico de leigos consagrados. Ou seja, negar por duas vezes a ordenação como cardeal não foi uma situação nova, e é impossível não notar a ironia implicada no fato de Deus levá-lo para si dois dias antes de se ver obrigado a aceitar algum posto diferenciado.

Mas podemos nos perguntar se sua produção literária teria sido tão prolífica caso ele tivesse optado por cátedras universitárias ao invés do trabalho pastoral. Sua obra mais conhecida é a trilogia “A Glória do Senhor” (ou “Teo-estética”), “Teo-drama” e “Teo-lógica”. Nela, Balthasar inverte a ordem de importância das três propriedades do ser da filosofia clássica grega – chamadas de três transcendentais –, que haviam sido arranjadas pelo filósofo Immanuel Kant na seguinte ordem: Verdade, Bondade e Beleza. No entanto, Balthasar percebe que muitos teólogos começavam pelo belo – como Agostinho, Orígenes, Bonaventura, João da Cruz –, e que em seu tempo (e, ouso dizer, no nosso também), começar a falar de Deus a partir de ideias de Verdade ou Bondade pré-estabelecidas não ajudava a criar pontes de diálogo, mas, ao contrário, afastava as pessoas, ao passo que começar pela Beleza não implicava em nenhuma ameaça, e trazia a abertura ao diálogo.

Mas ao contrário de pensar na beleza como algo subjetivo, ele empresta de Tomás de Aquino as características que, interseccionadas, objetivamente definem algo como belo: integritas (completude), consonantia (harmonia) e claritas (radiância). Com isso, Jesus Cristo é o modelo ideal do que é belo, uma vez que é completo no cumprimento de seu propósito, é a harmonia entre o divino e o humano, bem como irradia a verdade. E, assim como quando estamos diante de algo muito belo, isso nos detém, nos chama e nos envia, Cristo nos detém, nos nomeia (ou renomeia), e nos envia em nossa missão, tal como fez com Pedro e Paulo.

E a beleza de Cristo é bem expressa em sua obra “Mysterium Paschale”, na qual comenta sobre os eventos de morte e ressureição de Cristo, demonstrando como a descida de Jesus para o mais baixo da “mansão dos mortos” possibilita que Cristo agarre e puxe de volta à vida o mais baixo dos pecadores em sua ressureição. Tal evento do teodrama é deveras enfatizado na teologia de Balthasar, uma teologia de esperança, que “ousa esperar que todos sejam salvos”.

Por essas e outras razões é que o pensamento teológico de Hans Urs von Balthasar é um dos objetos de estudo da graduação livre em Teologia do Instituto Tomasiano.

Referências:

BALTHASAR, Hans Urs von. Dare we hope that all men be saved? San Francisco: Ignatius Press, 1987.

BALTHASAR, Hans Urs von. Mysterium Paschale: The Mystery of Easter. San Francisco: Ignatius Press, 1990.

BALTHASAR, Hans Urs von. Communio – A Program. In: Communio 33 (Spring 2006). © 2006 by Communio: International Catholic Review. Disponível em: <https://www.communio-icr.com/files/balthasar33-1.pdf>. Acesso em: 04 de maio de 2022.

BARRON, Robert. Bishop Barron on Hans Urs von Balthasar (Part 1 of 2). Youtube, 20 de maio de 2014. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=uqSenlCcFws&list=WL&index=30&ab_channel=BishopRobertBarron>. Acesso em: 04 de maio de 2022.

BARRON, Robert. Bishop Barron on Hans Urs von Balthasar (Part 2 of 2). Youtube, 23 de maio de 2014. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=A1RUtNmsHWU&list=WL&index=32&ab_channel=BishopRobertBarron>. Acesso em: 04 de maio de 2022.

MONDIN, Battista. Os grandes teólogos do século vinte. Tradução de José Fernandes. São Paulo: Edições Paulinas, 1979.

UFVedu – Universidad Francisco de Vitoria – Madrid – Máster de Humanidades. Introducción a la obra de Von Balthasar I – Prof. Ricardo Aldana Valenzuela, S. de J. Youtube, 12 de janeiro de 2016. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=T_Prb5brQ00&t=2318s&ab_channel=UFVeduhttps://en.wikipedia.org/wiki/Hans_Urs_von_Balthasar>. Acesso em: 04 de maio de 2022.

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